quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Dupond e Dupont

Afinal, as conversas de tasca sempre estiveram certas. Os estereótipos usados pelo povo eram exactos. É indiferente quem nos governe —o resultado é (praticamente) o mesmo.

As contradições de Passos Coelho (reunidas num vídeo de sucesso na Internet) provam que os políticos e os governos portugueses agem de forma semelhante, independentemente da sua cor partidária. Na oposição, prometem sem decoro, sem que os preocupe qualquer ligação à realidade. No Governo, fazem o que os deixam — ou o que são obrigados a fazer. A diferença está sobretudo no paradigma em vigor, na conjuntura.

Em tempo de vacas gordas, todos os governos, cada um à sua maneira, foram esbanjadores e incompetentes. Chegadas a crise e as imposições externas, todos dançam a toque de caixa. As eleições de Junho foram inúteis. Se não se tivessem realizado, a esta hora a austeridade estaria igualmente instalada e medidas “corajosas” do PS estariam a ser elogiadas nas instâncias internacionais. É um erro imaginar que não seria assim. O Passos Coelho de Maio não é o Passos Coelho de agora: caiu-lhe a realidade em cima. O Sócrates de agora não seria o Sócrates de Maio (ainda que, claro, fiel aos seus próprios defeitos, jurasse sempre que o era). Ambos são o que lá fora precisam que eles sejam.

Com algumas diferenças, apesar de tudo. Idiossincráticas, em parte. Passos Coelho parece ter a vontade de fazer algumas coisas bem, é mais frontal e bastante menos arrogante do que Sócrates. Só isto bastaria para o preferirmos. Mas há outra diferença que anula esta. Quando forçado a cortar ordenados, Sócrates fê-lo com alguma progressividade. Com Passos Coelho, acima de mil euros é tudo tratado da mesma forma. Sócrates poderia ter sido levado a aproveitar a conjuntura para implementar medidas que reduzissem o fosso entre rendimentos das classes, se algum do vento soprasse nesse sentido. Passos manter-se-á obstinado na sua liberalização radical mesmo que contra ele venha a soprar uma tempestade.